Rede de proteção de crianças e adolescentes – Unaí promove 1º Seminário Regional para debater tema e ofertar soluções para municípios

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- Especialista propõe que municípios regulamentem rede de proteção, adotem fluxos de atendimento e revisem papéis dos agentes da rede, com destaque para o Conselho Tutelar.

 

O evento foi realizado em Unaí nos dias 17 e 18 de agosto, sob organização do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e apoio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e Cidadania (Semdesc). Nove municípios (incluindo alguns do Norte de Minas) enviaram representantes.

 


Agentes do Conselho Tutelar, do CMDCA, da Semdesc, do Creas, dos Cras, da OAB, da Justiça, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Polícia Militar e Civil, do Sistema Socioeducativo, da Apae, da Casa da Acolhida, da Rede Cidadã, do CEM, da Casa Lar, do Sistema de Educação, do Cepasa, da Audec/Iceia participaram do evento, ou seja, entidades e profissionais que trabalham com a proteção de crianças e adolescentes.

 

Ministraram palestras o advogado Ariel Castro (ex-secretário da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) que abordou o tema “Os desafios do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) na atualidade”; e o procurador de Justiça do Estado do Paraná, Murilo José Digiácomo, que veio explanar e debater temas relacionados ao papel do Conselho Tutelar e da Rede de Proteção, sob os dispositivos da Lei 13.431/2017 e da Lei 14.344/2022.

 

NÃO CONFUNDIR REDE DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE COM REDE DE PROTEÇÃO SOCIOASSISTENCIAL

 


Durante palestra, o procurador Digiácomo (referência técnico-jurídica sobre o assunto) deixou bem claro que a rede de proteção à criança e ao adolescente precisa envolver equipamentos de saúde, educação, habitação, cultura, esporte, lazer e recreação.

 

“Não é só pensar em Creas, Cras, ou na rede de proteção sociassistencial (que atende outras camadas vulneráveis da população), mas pensar numa rede articulada e integrada de proteção à criança. Uma rede organizada para justificar sua existência e capacidade de atuação, de fato e de direito”, observou.

 

De acordo com o especialista, “é preciso regulamentar a rede de proteção (ao direito da criança)”, cabendo ao CMDCA, provocado pelo Conselho Tutelar, cobrar essa regulamentação. Ou seja, dizer quais são os componentes governamentais e não governamentais que farão parte da rede, que deverão se reunir, se encontrar, discutir, buscar soluções, para garantir a proteção efetivamente. E estabelecer as políticas públicas que garantirão esses direitos.

 


CONSELHO TUTELAR NO FOCO DA PALESTRA

 

“Tenho visto o Conselho Tutelar ser acionado aleatoriamente e sem qualquer justificativa. A lei não prevê isso. A lei prevê que a atuação do Conselho Tutelar tem de ser excepcional, justificada caso a caso. (A atuação ) Não pode ser generalizada”, criticou o procurador, ao acrescentar que alguns papéis precisam ser revistos, tomando-se a legislação por base.

 

“Quem disse que o Conselho Tutelar tem de pegar a criança e levar para o abrigo? Quem disse isso?”, questionou aos participantes. “Tem gente que acha que só o Conselho Tutelar (da rede de proteção) pode matricular uma criança na escola, levar a criança para o atendimento médico ou psicológico. Não, não é”, frisou o especialista. A função da equipe de resgate social (técnicos de assistência social ou psicossocial) será mencionada mais à frente.

 


USAR A CRIANÇA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO DOS PAIS

 

O procurador salientou que um pai agressor deve ser punido pela legislação penal e não pela “falha de proteção”, punindo a criança com o afastamento do convívio familiar. “O afastamento da criança da família pode ocorrer, desde que comprovadamente necessário. Quando a própria criança demandar”.

 

Proteger a criança (ou o adolescente), segundo o procurador, é respeitar seu direito de escolha. “O afastamento da criança da família, como forma de punição, pode até punir o pai, mas pode estar punindo, com muito mais intensidade, o próprio filho, se o afastamento da família não é o que a criança quer”.

 

E somente no último caso, o procurador acrescenta, o afastamento do convívio familiar e o acolhimento institucional devem ocorrer. “Somente no último caso, e se a criança concordar, é que vou pensar em encaminhá-la para o acolhimento institucional. Mas isso é o plano Z”.

 

NÃO CONFUNDIR ACOLHIMENTO COM RESGATE SOCIAL

 

Se uma criança precisa de atendimento emergencial, porque está em situação de extrema vulnerabilidade, quem deveria atuar no caso seria uma equipe de resgate social, com profissionais especializados da Assistência Social.

 

“Não é chegar o Conselho Tutelar fazendo o papel de resgate social, de assistência social. Porque não é”, enfatizou o procurador, apontando uma das situações que revelam o “desajuste” do sistema.

 

Para o especialista, não é chegar uma viatura do Conselho Tutelar e tirar a criança da escola, da casa da mãe, da rua, e levar para algum lugar institucionalizado. “Não é assim que se faz”.

 

Na sequência da afirmação, ele pergunta: “Como faz, então?”, e ele próprio responde: “Não sei, não sou técnico ou especialista em assistência social”. Em sua opinião, é necessária a abordagem especializada em assistência social (ou psicossocial), para a criança se sentir protegida, e não "sequestrada".

 

Ele relatou que, diante de crianças em situação vulnerável ou “violadas”, os técnicos precisam elaborar diagnósticos, ouvir os envolvidos, ter equipamentos especializados disponíveis (não somente o Creas, que atende outras camadas da população vulnerável), profissionais qualificados, e a preocupação de atender os casos mais complexos de forma diferenciada.

 

Inclusive ofertar um atendimento individualizado, e até em domicílio, para quem precisa. “Dar às crianças e às famílias a possibilidade de se manifestarem e construírem juntos uma saída para a situação em que se encontram. Ver o que é melhor para eles”. Isso é proteção.

 

Na opinião do palestrante, como o Conselho Tutelar não é órgão técnico, não tem de fazer relatório. “As famílias começam a se sentir perseguidas, têm medo de perder os filhos para o Conselho Tutelar. Medo de perder os filhos para uma rede de proteção que deveria proteger a família, antes de mais nada”.

 

FUNÇÃO PRIMORDIAL DO CONSELHO TUTELAR

 


De acordo com o procurador-palestrante, o Conselho Tutelar foi criado por lei “para ser protagonista da proteção, lá na origem, na política pública de prevenção”. Para ele, então, a função mais importante do CT é assessorar o Poder Executivo (no caso, as Prefeituras) na elaboração das propostas orçamentárias.

 

Se o projeto do orçamento já está na Câmara Municipal, em sua opinião, é hora de os conselheiros tutelares conversarem com os vereadores, fazerem projeções conjuntas para aplicação dos recursos necessários.

 

Digiácomo defende que a atuação do Conselho Tutelar precisa ter reflexos no orçamento municipal e no plano municipal coletivo, para a efetivação da política de proteção da criança e do adolescente.

 

“Mas, para isso o conselheiro tutelar precisa sair a campo, estar atento aos casos individuais, ouvir os usuários do atendimento, ter programas e serviços correspondentes às medidas que a lei prevê. Ele (o conselho) tem de acompanhar todo o processo de atendimento da criança, do início ao final”.

 

E, como o conselheiro tutelar é representante da sociedade e possui autonomia de atuação garantida por lei, o procurador defende que o conselheiro tem de ser respeitado pelas autoridades constituídas (como delegados, promotores de Justiça e juízes). Assim como também (o conselheiro tutelar) não pode desobedecer às normas legais e nem "destratar" essas autoridades.

 

Os temas abordados na palestra foram depois debatidos com os participantes numa rodada de perguntas e respostas e em discussões de casos reais e/ou potenciais.

 

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